sexta-feira, agosto 13, 2010

Silêncio


"Estavam naquela fase em que um dá de presente as vontades do outro. A melhor fase, diga-se. Depois vem o tempo em que um ignora as vontades do outro e, no fim, o tempo em que passa a contrariá-las." O Amor e Outros Objetos Pontiagudos (Marçal Aquino)

Ele chegou subitamente. Toc toc na janela. Ela entreabriu e reconheceu a fisionomia. Fechou-a levemente. Escorou-se na parede e pensou se deveria ou não abrir. Decidiu sair correndo pelos fundos da casa. Ele esperou... Quando ela voltou, ele ainda estava lá... Ela resolveu abrir a janela. Conversaram na sacada, sentados, como crianças, observando o movimento da rua... Fizeram juras de amor eterno, tocaram-se em mãos entrelaçadas que, a muito custo, desvencilhavam-se às vezes... Ela sussurava, ele fazia mímicas e truques de mágica...
No outro dia, ele demorou a chegar, mas veio... Ela abriu a porta, convidando-o a entrar. Ele titubeou... Tocaram as mãos um do outro, beijaram-se, mergulharam em si mesmos, como se aquela fosse a última noite da existência...
Abruptamente, ele foi embora. Voltou muito tempo depois, transtornado. Ela abriu a porta, cheia de saudade. Ele não quis entrar. Ela insistiu. Começou a chover. A chuva aumentou. Ele não entrou... Preferiu ir embora de vez, junto com a chuva. Para ele, a chuva era previsível, como ela nunca seria... Ela continuou na janela, esperando que ele voltasse, lembrando daquilo que ele dizia, do seu semblante, do seu sorriso, de suas mãos e de suas mágicas. Um dia, ela fechou a janela, depois a porta e abandonou a casa. Procura ainda hoje por ele, seja onde chove ou onde faz sol...

Nenhum comentário: