sábado, maio 15, 2010

O chamado


Quando João nasceu, figurava, entre as preocupações da mãe que vos fala, o cuidado com o umbigo dele. Desde quando ainda estava na maternidade, a enfermeira recomendou que passasse álcool (acho que de 90 graus) até que o dito cujo caísse. As muitas novidades, que descobri somente quando estava grávida (como a barriga que coça muito quando está esticando ou que mulher prenhe tem muitas cãibras, principalmente quando acorda), continuaram depois do parto... E, dentre elas, a atenção especial ao umbigo do recém-nascido. Atenção não meramente relacionada à higiene mas a questões bem mais abstratas... Bem, a questão-chave era: o que fazer com o cordão umbilical depois que ele caísse? Na verdade, eu nem tinha me feito esta pergunta mas a minha vizinha, que foi uma das primeiras pessoas a se encantar por João, não deixou de fazê-la e, antes que eu respondesse, ela já foi dizendo que eu JA-MA-IS deveria jogá-lo no lixo porque algum rato iria comê-lo e isso traria maus agouros pra vida do meu filhote. Como eu só não duvido da fé, levei em conta seus conselhos: o cordão deveria ser colocado numa porteira de uma fazenda ou em água corrente, de preferência, num rio. A primeira opção era inviável por motiivos óbvios. Então, lá iria eu dar um jeito de jogar o pedacinho umbilical no Capibaribe (não exatemente aquele dos poemas de João Cabral), por ser o mais próximo, embora não o mais limpo. Mas tudo se resolveu mais rápido do que eu pensava. Ao comentar com meu amigo Fernando, sobre o que dissera minha vizinha, ele prontificou-se a dar um ajuda. Como iria dali a alguns dias pro Sertão, a trabalho, perguntou se eu não queria que ele jogasse o cordão umbilical no rio São Francisco... Achei uma ótima idéia! E lá se foi a encomenda pro Velho Chico. Um momento histórico, com foto e tudo, pra ficar pra posteridade. O engraçado disso tudo é que, quatro anos depois, estou morando em Petrolina, cidade banhada pelo ilustre e grandioso rio. Há pouco tempo, fui com João fazer a travessia de barca entre Petrolina e Juazeiro e apresentei o rio pra ele. De São Francisco, ele virou "João Francisco", segundo meu filho insistiu em chamá-lo. Logo depois ele disparou a pergunta: "- Cadê meu umbigo?". Depois disso, fiquei pensando sobre o episódio. Dizem por aqui que, quem bebe a água do rio São Francisco sempre volta. Parece que posso afirmar outra coisa: quem joga cordão umbilical no mesmo rio, chega ao sertão, pelo chamado do rio. Só não sei se volta...